Compositor. Cantor. Radialista.
Com 16 anos aprendeu a tocar violão. Cursou até o segundo ano de Medicina, mas abandonou os estudos para seguir a carreira artística. Ganhou o apelido de Gordurinha dos amigos de rádio por sua magreza. Em 1964 desagradado com o golpe militar, fugiu de casa deixando com os familiares a determinação para que destruíssem tudo o que parecesse comprometedor, especialmente uma foto em que aparecia tocando violão para o presidente João Goulart e o governador Leonel Brizola. Maltrapilho e doente, só reapareceu meses depois. Faleceu em 1969 de infarto provocado por uma overdose.
Começou a carreira artística aos 16 anos, apresentando-se em um programa de calouros na Rádio Sociedade da Bahia, em Salvador. Na época participou do grupo vocal “Caídos do Céu”. Em 1951 começou a produzir e apresentar programas na Rádio Tamandaré do Recife, em Pernambuco. Em 1952 foi para o Rio de Janeiro para dar continuidade à carreira artística. Pouco depois mudou-se para Recife onde atuou nas Rádios Jornal do Comércio e Tamandaré. Em 1954 teve sua primeira composição gravada por Jorge Veiga, o baião “Quero me casar”. No mesmo ano, a dupla Venâncio e Corumba gravou o baião “Cadeia da vila”. Em 1955 gravou com Leo Villar seu primeiro disco, interpretando a marcha “Soldado da rainha”, dele e João Grimaldi, e “Sonhei com você”, de Roberto Martins e Mário Vieira, com vistas ao carnaval do ano seguinte. Em 1957 apresentou na Rádio Nacional o programa “Varandão da casa grande”. Apresentou ainda os programas “Café sem concerto” na Rádio Tupi e “Boate Ali Babá”, na TV Tupi. Em 1958, Ari Lobo gravou o coco “Quixeramobim”. No mesmo ano, gravou um de seus grandes sucessos, o , o coco “Vendedor de caranguejo”.
Em 1959, o samba “Chiclete com banana”, parceria com Almira Castilho, foi gravado com grande sucesso por Jackson do Pandeiro. Este samba, além de peça de teatro, foi tema de uma tira de histórias em quadrinhos, do desenhista Angeli e foi nome de uma banda de música baiana. Ainda no mesmo ano, fez grande sucesso com o baião “Baiano burro nasce morto”, que geraria um famoso bordão nas televisões da época. Também no mesmo ano, seu samba “Carta de ABC” foi gravado por Gilberto Alves no LP “Gilberto Alves e o samba”. Ainda em 1959, o samba “Orora analfabeta”, com Nascimento Gomes, fez sucesso no carnaval na gravação de Jorge Veiga, pela Copacabana. Em 1960 gravou mais um grande sucesso, o baião-toada “Súplica cearense”, composto em parceria com Nelinho, composição considerada pela crítica como sua obra-prima e uma das músicas mais pungentes em solidariedade aos miseráveis da seca nordestina. No mesmo ano, o cantor Antônio Martins gravou o tango “Ribalta”. Teve diversas composições gravadas pelo cantor Jorge Veiga, entre as quais os sambas “Caixa alta em Paris”, “O marido da vedete” e “Quando o divórcio chegar”. Ari Lobo gravou os cocos “Paulo Afonso” e “Pedido a padre Cícero”. Em 1962 lançou o LP “A Bossa do Gordurinha”, com destaque para “Baiano não é palhaço”. Em 1963 lançou pela Copacabana o LP “Gordurinha…um espetáculo”, com destaque para “Fornalha” e “Baião bem”. Como produtor musical ajudou a fazer os melhores discos do Trio Nordestino. Em 1968, Augusto Boal dirigiu no Teatro de Arena de São Paulo o musical “Chiclete com banana”, inspirado na música de Gordurinha, criticando as relações desiguais entre a música brasileira e a música estrangeira, particularmente a norte-americana. Em 1972, Gilberto Gil, em disco lançado após seu retorno do exílio em Londres, regravou “Chiclete com banana”. Em 1974, o cantor Macalé gravou “Orora analfabeta” e “Mambo da cantareira”, no LP “Aprender a andar”.
Em 1997, o Trio Nordestino, em sua nova versão, regravou o “Mambo da cantareira”. Em 1999 o selo “Sons da Bahia” sob o patrocínio do Governo do Estado e com lançamento comercial pela Warner Music gravou o disco “A confraria do Gordurinha”, com 16 faixas de sua autoria interpretadas por Gilberto Gil, que cantou “Baianada” e mais três músicas, Confraria da Bazófia e ainda Marta Millani. Em 2000, a Warner Music na série “Enciclopédia Musical Brasileira”, lançou o CD “Jackson do Pandeiro e Gordurinha”, no qual o cantor e compositor baiano aparece interpretando sete composições de sua autoria, entre as quais, “Oito da Conceição”, “Vendedor de carangueijo” e “Qual é o pó?”. Em 2007, teve a música de sua autoria, junto com Almir Castilho “Chiclete com banana” gravada pelo cantor e compositor Kojak do forró, no álbum ao vivo “O afilhado do rei do ritmo Jackson do Pandeiro”. O CD/DVD, de lançamento independente, produzido por Kleber Matos, foi uma homenagem ao cantor e compositor Jackson do Pandeiro que imortalizou a composição. Em 2012, recebeu outra homenagem do cantor Kojak do Forró ao ter nove músicas suas gravadas no DVD “50 anos de sucesso”, em que Kojak celebrou cinco décadas de carreira. No álbum, gravado ao vivo na Sala Funarte Sidney Miller no Rio de Janeiro, foram gravadas composições suas como “Baiano burro nasce morto”, “Tenente Bezerra”, “Caranguejo Sá”, “Belém de Maria”, entre outras, além da clássica “Chiclete com banana”, parceria sua com Almira Castilho.
(C/Mário Tupinambá)
AZEVEDO, M. A . de (NIREZ) et al. Discografia brasileira em 78 rpm. Rio de Janeiro: Funarte, 1982.
MARCONDES, Marcos Antônio. (ED). Enciclopédia da Música popular brasileira: erudita, folclórica e popular. 2. ed. São Paulo: Art Editora/Publifolha, 1999.
Quem é esse até hoje desconhecido Gordurinha?
Ele nasceu Waldeck Artur de Macedo, em Salvador (1929), e recebeu o apelido – péssimo, por sinal – porque exibia uma figura magérrima quando estreou como cantor-ator cômico em 1938 na Rádio Sociedade da Bahia.
Do mesmo modo que Noel Rosa, Gordurinha largaria a Escola de Medicina no 2o ano para embrenhar-se exclusivamente pela música, pelo palco e pelos microfones. Só que – também como Noel – não foi feliz. Sua vida se transformaria num rosário de lágrimas, apesar de ter tentado esconder as tristezas e os muitos problemas em incontáveis músicas satíricas, que ele próprio interpretava pelo microfone da Rádio Nacional, a partir de 1952, a convite do todo-poderoso Vítor Costa, diretor da então considerada “maior emissora da América Latina”.
Como algumas tiveram sucesso – “Chiclete com banana”, “Baianada” (Um baiano, um coco/ Quatro baianos uma baianada) ou “Baiano burro nasce morto” – ao Gordurinha ficou pespegada pela crítica da época a maldição de “cantor gaiato”. Isso teria sido fatal para ele, poeta sensível das já citadas peças líricas “Vendedor de caranguejo” ou “Súplica cearense”. O resultado foi trágico, porque ele mergulharia em drogas pesadas. Tornou-se um viciado em morfina, a pretexto de solução para uma asma que lhe corroía os pulmões.
Lembro-me de que certa vez estava na casa do Luiz Gonzaga, na Ilha do Governador – lá por 1969, – quando entrou Gordurinha, muito pálido, arfante, olhos levemente esbugalhados. Gonzaga suspirou fundo ao ver o amigo naquele estado e me disse: “Esse cabra aqui me faz inveja duas vezes. A primeira, ter escrito a “Súplica cearense”, que eu adoraria ter assinado.” E, baixando a voz, para evitar ser ouvido pela mulher Helena: “A segunda coisa que eu não tive coragem de fazer e que esse cabra fez foi sair pra tomar um café, dizer à mulher que voltaria em instantes e só ter regressado há pouquinho tempo, três anos depois.”
Gonzaga tinha razão. Gordurinha tinha, finalmente, voltado a casa para – como os elefantes – morrer no lugar certo. Matou-o, em 16 de janeiro de 1969, uma overdose de morfina. O Brasil entrava nas trevas do AI-5 e os jornais mal registraram a morte do “cantor de coisinhas satíricas”.
Ricardo Cravo Albin