
Cantor. Compositor.
Foi o primeiro filho do casal José Vandregísilo e Maria Eugênia. Com gênio irrequieto, foi internado pelo pai no Colégio São José, em Nazaré da Mata, interior de Pernambuco. Desde tenra idade demonstrou interesse em cantar no rádio, tendo participado de diversos festivais de canto no colégio. Aos 14 anos, participou de um programa de calouros na Rádio Tabajara de João Pessoa. Em 1951, sua família mudou-se para o Rio de Janeiro, o que contribuiu para sua entrada na carreira artística.
No Rio de Janeiro, foi representar a Paraíba no Programa César de Alencar, apresentando-se com o nome de Carlos Dias. Carlos em homenagem a seus ídolos, os cantores Carlos Galhardo e Carlos José, que então começava, e Dias, de seu próprio sobrenome. Em 1955, com o nome de Carlos Dias, apresentou-se num festival promovido pela TV Rio defendendo a composição “Menina”, de Carlos Lyra. Nesse período, conheceu o pianista Paulo Burgos da boate “Tudo Azul”, que funcionava em cima do Hotel Vogue e passou a freqüentar toda noite o ambiente das boates. Decidido a ingressar na carreira artística, convenceu a mãe a patrocinar a gravação de um disco onde cantava fazendo imitações de Orlando Silva e Francisco Alves, e que saía mostrando nos lugares que freqüentava. Passou a percorrer as rádios para mostrar seu disco e assim conheceu e tornou-se amigo de Valdemar Henrique, que era folclorista e compositor e comandava um programa na Rádio Roquete Pinto. Conheceu também diversos artistas, entre os quais, Ed Lincoln, Luís Eça e Baden Powell. Nessa época, mudou seu nome para Geraldo Vandré, Geraldo, seu primeiro nome e Vandré, abreviação do segundo prenome do pai, por sugestão de Valdemar Henrique e José Vandregísilo, estudiosos de numerologia e que disseram que aquele seria um nome forte e de futuro. Pouco depois, no último ano do curso clássico conheceu um colega baiano que também tinha planos de seguir carreira artística, João Gilberto. Projetaram a formação de uma dupla e seguir para Porto Alegre, onde morariam num apartamento em cima de uma boate. Sua mãe, entretanto, brecou os planos, pois queria que o filho fizesse o exame Vestibular. João Gilberto voltou para a Bahia. Foi aprovado no vestibular e em pouco tempo passou a fazer parte do movimento estudantil, integrando-se ao CPC, Centro Popular de Cultura da UNE, União Nacional dos Estudantes, onde aumentou o laço de amizade que já mantinha com Carlos Lyra, seu primeiro parceiro musical. Nesse período teve aulas de canto. Suas primeiras composições com Carlos Lyra foram “Quem quiser encontrar o amor” e “Aruanda”, gravadas por Lyra. No último ano do curso de Direito, começou a freqüentar uma turma de estudantes em São Paulo, juntamente com Carlos Lyra e Oscar Castro Neves, e que ficava hospedada numa pensão próxima do Colégio Mackenzie. Na pensão dirigida por Paulo Cotrim, reuniam-se estudantes universitários. Os freqüentadores transferiram-se pouco depois para a Boate João Sebastião Bar, de propriedade de Cotrim. Nesse período fez mais algumas composições. Com Alaíde Costa criou “Canção do nosso amor” e com Baden Powell, “Nosso amor”, “Fim de tristeza”, “Se a tristeza chegar”, “Rosa flor” e “Samba de mudar”. Em 1962, gravou com a cantora Ana Lúcia a canção “Samba em prelúdio”, de Vinícius de Morais e Baden Powell. No mesmo ano, formou-se em Direito e pôde dedicar-se inteiramente à música. Enquanto o sucesso não chegava, começou a trabalhar como fiscal da Cofap (Companhia Federal de Abastecimento) e projetou a montagem de um escritório de advocacia. No entanto, “Samba em prelúdio” transformou-se em sucesso e começou a realizar diversas apresentações com Ana Lúcia. Ao mesmo tempo, procurava uma nova estética musical, desgostoso que estava com os rumos jazzificados que a Bossa Nova estava tomando. Nessa linha, compôs “Canção nordestina”, apresentada num show de Bossa Nova no colégio Mackenzie e recebida com impacto e espanto pela platéia. Continuava a cantar na boate João Sebastião Bar, revezando-se com Ana Lúcia, Claudette Soares, Marisa Gata Mansa, Pedrinho Mattar, Sambalanço Trio, Alaíde Costa e outros que iam do Rio para São Paulo. Na mesma época apresentava-se no programa de vanguarda “Mobile”, apresentado por Fernando Faro, na TV Tupi de São Paulo. Em 1964, casou-se pela primeira vez, com Nice Tranjon, na mesma boate onde trabalhava. No mesmo ano, lançou seu primeiro disco, obtendo repercussão com as composições “Fica mal com Deus”, de sua autoria e “O menino das laranjas”, de Teo. Em 1965, foi convidado pelo cineasta Roberto Santos para compor a trilha sonora do filme “A hora e a vez de Augusto Matraga”. No mesmo ano, interpretou a composição ” Sonho de um carnaval”, de Chico Buarque de Holanda no Primeiro Festival de Música Popular Brasileira”, da extinta TV Excelsior, obtendo o sexto lugar. Ainda em 1965, lançou seu segundo LP “Hora de lutar”, onde destacaram-se a música título, de sua autoria, “Dia de festa”, dele e Moacyr Santos, “Samba de mudar”, em parceria com Baden Powell, “Sonho de um carnaval”, de Chico Buarque e “Asa branca”, de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. Em 1966, venceu o II Festival da Música Popular da TV Excelsior, interpretando a marcha rancho “Porta-estandarte”, feita em parceria com Fernando Lona. A vitória no festival abriu caminho para a realização de uma turnê pelo Nordeste, em companhia do Trio Novo, composto por Teo de Barros, Heraldo do Monte e Airto Moreira. No final da temporada, Hermeto Pascoal agregou-se ao grupo, formando o Quarteto Novo. No mesmo ano, participou do festival de Música Popular da Record, apresentando a composição “Disparada”, feita em parceria com Teo de Barros e defendida por Jair Rodrigues e Trio Marayá, que tirou o primeiro lugar, empatada com “A banda”, de Chico Buarque. Com Tuca compôs “O cavaleiro”, que se classificou em segundo lugar no I Festival Internacional da Canção no Rio de Janeiro. Com esses resultados, abrem-se para ele as portas da televisão. Lançou ainda seu terceiro LP, “Cinco anos de canção”, com destaque para as composições “Porta-estandarte”, “Réquiem para Matraga”, “Canção nordestina” e “Pequeno concerto que virou canção”. Nessa época conheceu Caetano Veloso, Gilberto Gil e Torquato Neto. Com Gil e Torquato compôs “Rancho da rosa encarnada”, inscrita no Festival da Excelsior, mas desclassificada e depois gravada por Gil. Em 1967, apresentou os programas “Disparada”, na TV Record, “Canto geral”, depois chamado de “Canto permitido”, na TV Bandeirantes e “Caminhando”, na TV Globo. Nesse mesmo ano, increveu-se nos festivais da Record com “Ventania (De como um homem perdeu seu cavalo e continuou andando)” e “Da serra, da terra e do ar”, no Festival Internacional da Canção, que entretanto não foram classificadas. Lançou nesta época, seu quarto LP, “Canto geral”, onde interpretou entre outras, “Cantiga brava”, “Maria Rita” e “Arueira”, de sua autoria e “O plantador”, “João e Maria” e “Guerrilheira” em parceria com Hilton Acioli, componente do Trio Marayá, que tomou parte nas gravações. Em 1968, participou do Festival Internacional da Rede Globo com a composição “Caminhando” também conhecida como “Pra não dizer que não falei das flores”, que ficou em segundo lugar, perdendo para “Sabiá”, de Tom Jobim e Chico Buarque, apesar da preferência do público que cantou em uníssono a canção de Vandré. A composição tornou-se um hino de protesto naqueles tempos de luta contra a ditadura militar, tendo sido segundo alguns críticos, um dos estopins da decretação do AI-5, que acabou por endurecer o regime militar da época. No mesmo ano, foi lançado o LP “Caminhando”, que logo foi proibido pela censura. Ainda em 1968, a composição “Che”, com música de Marconi Campos e letra sua , venceu o Festival Internacional de Música da Bulgária, apresentada pela Trio Marayá. Realizou no Teatro Opinião, no Rio de Janeiro, o show “Pra não dizer que não falei das flores”, que ficou pouco mais de um mês em cartaz. Convidado pelos padres dominicanos de São Paulo, compos a trilha musical e os versos da “Paixão segundo Cristino”, apresentando de forma diferente o episódio da crucificação de Cristo. O clima político acirrou-se e teve que partir para o exílio no Chile. No país andino chegou a participar de alguns festivais universitários e compôs “Desacordonar”, que foi apresentado em um concurso de misses. Por não possuir registro para trabalhar como músico profissional, foi obrigado a abandonar o Chile. Viajou para assistir a um festival de arte negra na Argélia e de lá seguiu para a Alemanha, onde gravou alguns programas na TV da Baviera. Com o dinheiro obtido comprou um carro e continuou viajando, passando por Grécia, Áustria e Bulgária, entre outros países. Apresentou-se em diversas povoações em troca de comida, sempre cantando em português. Em 1970, na França, teve contato com uma espécie de colônia artística brasileira. Na capital francesa, apresentou com sucesso a “Paixão segundo Cristino”, montada na Igreja de Saint-Germain. O espetáculo abriu-lhe caminho para uma apresentação na Cité Universitaire. Ainda em 1970, gravou na França, com o Quinteto Violado, o seu quinto disco, “Terras do benvirá”, que somente seria lançado no Brasil, três anos depois. Em 1973, retornou ao Brasil, mas sua carreira não conseguiu ter continuidade, pois continuava vigiado de perto pela ditadura militar e impedido de prosseguir as atividades artísticas. Após a Anistia, tentou retomar a carreira, apresentando-se no Paraguai em 1982 e 1985. Em 1994, compôs a música “Fabiana” em homenagem à Aeronáutica, que rendeu viva polêmica e bastante perplexidade entre seus antigos admiradores de esquerda. Em 1995, fez uma apresentação no Memorial da América Latina, em São Paulo, ocasião na qual apresentou “Fabiana”, acompanhado por um coral de cadetes. Em 1996, foi lançado um CD duplo com o conjunto de sua obra. Em 1997, o Quinteto Violado gravou um disco interpretando composições suas, incluindo a inédita “República brasileira”. Em 2000 o cantor e compositor paraíbano Zé Ramalho gravou “Prá não dizer que não falei de flores”, no CD duplo “Nação nordestina”.
Em 2002, a Rádio Tabajara AM, de João Pessoa, Paraíba, apresentou no programa “Espaço experimental”, produzido pelo Laboratório de Radiojornalismo do Curso de Comunicação Social da UFPB, sua peça “Paixão segundo Cristino”, gravada a partir de uma montagem encenada em 1984 em Curitiba, além de obras inéditas de sua autoria. Em 2009, teve a sua música, “Disparada” (c/ Theo de Barros), gravada em nova versão pelo cantor Ricky Vallen, no CD/DVD “Rick Vallen ao Vivo”, lançado pela Sony Music.
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