
De acordo com o poeta e pesquisador manauara Simão Pessoa, em seu livro “Funk – A música que bate”, no início da década de 1970 o gênero soul music, norte-americano, fazia sucesso no Brasil. Os principais artistas por aqui conhecidos eram James Brown e sua banda JB’S, Aretha Franklin, Ray Charles, Marvin Gaye, Stevie Wonder, grupos vocais como Blue Magic, Jackson Five e Staylistcs, a maioria, artistas da gravadora Monthown, fundada na década de 1960.
Alguns artistas brasileiros logo assimilaram esta tendência, entre eles Dom Salvador e Grupo Abolição, Tim Maia, Carlos Dafé, Sandra de Sá, Tony Tornado, Gérson King Combo, Hyldon, Lady Zú, Cassiano e Banda Black Rio, e faziam apresentações nos bailes suburbanos. Muitos deles trabalhavam com ‘play-back’ com apoio das equipes de som como a Soul Grand Prix, Monsieur Lima, Big Boy, A Cova, Cash Box e Furacão 2000.
No início da década de 1980 a sonoridade do soul music mudou para o Miami bass, com as batidas graves acentuadas, daí o título de um dos principais desdobramentos sonoros do funk. Este modelo de batida fora usado anteriormente por James Brown em 1965 na composição “Papa’s got a brand new bag”, mais ou menos “Papai conseguiu algo novo e excitante”, no qual a sessão rítmica do contrabaixo era sincopada no primeiro compasso (backbeat), criando o funk americano, gênero próximo ao soul music.
Apesar de o nome ser o mesmo, o funk na acepção antiga (décadas de 1970/80, no Brasil e nos E.U.A) e o funk da década de 1990 têm certas semelhanças e diferenças, contudo não são as mesmas coisas. Inclusive há quem defenda que não deveria ter este nome. A primeira geração do funk era engajada no conceito de negritude e com o ritmo mais parecido com o soul music (Tim Maia, Carlos Dafé, Sandra de Sá etc) e a segunda geração (Tati Quebra-Barraco, Bonde do Tigrão, Bonde do Faz Gostoso etc) com valores ideológicos mais dispersos, quase sempre ligados a posicionamentos da relação entre mulher e homem, além do ritmo estar mais para o charm, discoteque e outros subgêneros derivados do soul music. Também foram percebidos aspectos da marchinha em vários raps ou funks-melody, principalmente nas composições da dupla Claudinho & Bochecha. Quanto à questão do escracho e do erotismo no funk, há quem defenda que ele veio pra amenizar a violência dos bailes-funk. A criminalização, ou a glamouralização dos bailes funks, sempre dependeu muito da mídia usada.
O funk carioca é denominado pelo termo “Bundalelê”, talvez por sua vocação a assuntos ligados as coisas amenas. Quem cunhou esta designação foram os funkeiros paulistas, que apesar de usarem a mesma batida melódica, fazem uso de um discurso mais engajado.
Os principais desdobramentos do funk são o funk-melody, o “Proibidão” (de cunho social, engajado e doutrinário), o “Funk Ostentação”, tendência hedonista do gênero, e o funk-erótico, conhecido como ‘Funk sensual’ que versa sobre sexo, transa etc. Os outros desdobramentos são o “Funk-Miami”, que traz a influência da música feita nesta cidade americana, onde predomina a imigração latina, tem como base o ritmo e usa a bateria eletrônica e samples de músicas do soul music, discoteque, marchinhas etc, sendo também conhecido como “Batidão”, mais propagado na periferia do Rio de Janeiro. O funk erótico tem vários expoentes, entre eles Tati Quebra-Barraco, Bonde do Faz Gostoso, Bonde do Tigrão, As Tchutchucas, Vanessinha Picachu, entre outros.
De acordo com o pesquisador e escritor Euclides Amaral, in “O Funk”, um dos ensaios integrantes do seu livro “Alguns Aspectos da MPB”
“O funk, de produção fácil, tendo em vista que os funkeiros cantam em uma bass rítmica basicamente em cima do techno, fez com que fosse muito difundido, principalmente nas camadas mais pobres. Qualquer estúdio barato reunia condições tecnológicas de produzir um disco de funk, bastando samplear algumas batidas e colocar a voz em cima, mantendo um discurso mais popular, usando o erótico como base e chamariz, fazendo com que artistas da comunidade passassem a gravar com muito mais facilidade e frequência. Criou-se então uma geração eletrônica, pois em cima de uma base rítmica o artista falava o que queria. Mais tarde foram incorporados outros grooves internacionais, aproveitando os loops das canções e ainda ritmos regionais como maracatu, macumba, candomblé, marchinha e samba, entre outros. Outra vertente do funk denominado de “Proibidão” é considerada um subgênero que fala da violência, tráfico de drogas, sendo pouco divulgado fora das favelas. Este tipo de funk trata de assuntos ligados à marginalidade (como nomes de morros, chefes de tráfico, gente da comunidade que foi morta por policiais etc), causando assim uma perseguição a seus compositores. Os rappers do funk proibidão geralmente usavam toucas ninjas com as quais escondiam o rosto e não assinavam as composições, mesmo que parte da comunidade saiba até quem as compôs. Nesta categoria de “Funk proibidão” estão também composições que exaltam as façanhas de determinadas facções criminosas, sendo a maioria destas composições cantadas basicamente por pessoas ligadas ao tráfico e não pela comunidade. MC Mr. Castra é considerado um dos expoentes do “Funk Proibidão”. Várias de suas composições foram incluídas nas coletâneas piratas “Proibidão do rap”, por suas músicas enaltecerem facções criminosas do Rio de Janeiro e ainda versarem sobre problemas de sua comunidade. Participou da coletânea “Proibidão liberado”, no qual interpretou as faixas “O lucro parte II” e “Aba roedor”, em parceria com Beto da Caixa. Entre suas composições mais divulgadas estão “Cachorro”, referindo-se à polícia militar. De acordo com MC Mr. Castra o crime faz parte da cultura da favela e estar, segundo ele, relatando uma realidade não quer dizer fazer apologia ao tráfico. Suas composições foram incluídas na série de CDs piratas “Proibidão do rap”. Em 30 de dezembro de 2002 a polícia carioca apreendeu mais um lote de CDs piratas da série “Proibidão do rap”, disco no qual constavam algumas composições de sua autoria.”
No início dos anos de 1990 o funk surgia como um sucesso de mídia. Uns diziam que a indústria fonográfica acabara de inventar o ritmo para repor o comércio decadente dos grupos de pagode, do axé music e principalmente do sertanejo. Na época, o funk invadia vários espaços como academias de dança, bailes do Chapéu Mangueira, Ladeira dos Tabajaras, Quadra do Salgueiro, academias de ginástica, boates (Circus, em São Conrado, Hard Rock), clubes (Mourisco, Bouqueirão, Coqueluche, na Cidade de Deus) e até shows de samba. No final da mesma década, o funk da moda era o que tinha um forte apelo sexual com letras fáceis e refrão repetitivo. Logo depois o funk foi proibido. Contudo em 2003 através da sanção da Lei Estadual 4.264/2003, de autoria do deputado Alessandro Calazans, os bailes foram regulamentados e autorizados novamente, sendo organizado por vezes até em novas boates e casas de shows como Ballroom mesmo em festas da Comunidade Judaica carioca. Sobre os bailes-funk e a violência deles, principalmente dentro das favelas, tem-se notícia de que muitos dos bailes eram organizados por marginais, no qual o principal fim era a venda de drogas. O funk tanto sofre perseguição, quanto é glamourizado e frequenta lugares fashions, criando expectativas, como em 2003, quando a diretora teatral Bia Lessa dirigiu um desfile-espetáculo “Fashion Rio” criado para a grife Blue Man, evento no qual, segundo matéria do Suplemento Ela, do Jornal o Globo, transformou o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro em um point que reuniu funkeiros e intelectuais. No ano posterior, em 2004, com grande audiência, o programa “Furacão 2000”, de Rômulo Costa, era levado ao ar diariamente na TV Bandeirante, no qual o apresentador destrinchava todo o mundo funk, desde os bailes em vários pontos do Rio de Janeiro, quanto aos novos lançamentos do gênero. Existiam outros programas, como o da ex-esposa Verônica Costa. Esta se autointitulando “A Glamourosa” em diversos outdoors pela cidade, elegendo-se até vereadora com os votos segmentados dos funkeiros. Um dos primeiro a enaltecer o funk carioca foi o fotógrafo de moda Ernesto Baldan, que em 1998 fez fotos da modelo Fabiana Duarte no baile do Clube Emoções, na Rocinha, favela da Zona Sul do Rio de Janeiro. As fotos foram publicadas na revista “Vizoo”, neste mesmo ano. Em 2003 Mari Stockler, diretora de arte, figurinista e fotógrafa, lançou o livro “Meninas do Brasil”, com fotos de várias mulheres em bailes funks. No ano de 2004 a estilista Wendell Bráulio, no evento Fashion Rio, mostrou a influência do hip hop em sua coleção. O DJ Marlboro apresentou-se no “Tim Festival”, sendo também o proprietário do selo Link Record, responsáveis pelo lançamento de vários discos de funk, principalmente em bancas de jornal. Entre os discos mais conhecidos deste selo destaca-se a coletânea “Proibidão liberado”, lançada também em 2004. A boate Fosfobox, em Copacabana, na Zona Sul e a casa de show Olimpo, na Vila da Penha, Zona Norte do Rio de Janeiro, foram locais da classe média carioca onde o funk era a música do momento. MC Tati Quebra-Barraco apresentou-se em show no Palco d’A Lôca, no desfile da Grife Cavalera, no evento São Paulo Fashion Week, em São Paulo. Também no âmbito internacional o funk apareceu em outros lugares ligados à moda. O DJ Zé Pedro comandou um baile funk na principal loja de departamentos em Londres, a Selfridges, que usualmente usava um tradicional coquetel de abertura. MC MR. Castra e DJ Marlboro apresentaram-se, em épocas diferentes, na casa noturna Favela Chic, em Paris. A MC Tati Quebra-Barraco foi convidada a participar do “Festival Ladyfest”, em Stuttgart, na Alemanha, além de apresentar-se também em uma festa para convidados no Palácio da República, em Berlim e ainda fez shows em Berlim, Zurique e Amsterdã. O Programa da Xuxa, na Rede Globo, foi um dos que absorveu o funk, a tal ponto que, quando a apresentadora entrou de férias foram convidados para substituí-la vários artistas famosos, entre eles Ivete Sangalo, Sandra de Sá e a dupla Claudinho & Bochecha, uma das mais famosas do funk na época. Outro programa também importante para a difusão do funk foi “Big Mix”, programa de rádio de DJ Marlboro iniciado na Rádio Manchete no final da década de 1980, assim como o programa de televisão “Furacão 2000”, de Rômulo Costa. Um dos primeiros documentários sobre o funk, “O funk carioca”, foi transmitido pelo Canal Futura no ano de 2001. Anos depois, em setembro de 2004, o documentário “Sou feia, mas tô na moda”, de Denise Garcia, usou como fio condutor da história uma das frases de impacto da MC Tati Quebra-Barraco (Tatiana dos Santos Lourenço – 1980). Tati é considerada a MC mais polêmica do mundo funk e recebeu o apelido de “Tim Maia do mundo funk” por suas declarações e posições bem definidas com relação à posição da mulher na sociedade e do funk no cenário musical brasileiro. No filme vários artistas do funk aparecem dando entrevista e atuando em bailes, entre eles Elaine das Graças, Kelly, Danielle Braz e Ana Cristina dos Anjos (vocalistas do grupo Tchutchucas), Vanessinha Picachu, além de Tati Quebra-Barraco, Bonde do Tigrão e Bonde do Faz Gostoso. O visual funkeiro tanto atinge homens, quanto mulheres. Segundo o escritor Euclides Amaral em seu ensaio “O Funk”, do livro “Alguns Aspectos da MPB”, é na mulher que o funk encontra a sua maior expressão com relação à vestimenta. Vanessinha Picachu comentou em entrevista que quando se veste de um jeito, no baile seguinte várias meninas já estão com o mesmo tipo de roupa. As meninas do funk vestem-se, também, em lojas de departamento e é comum encontrar camisetas sobrepostas de cores inversas, calças brancas apertadíssima ressaltando as formas, sapatos plataforma, bonés e calças da marca Gang. Sobre o uso, principalmente das calças da marca Gang, merecidamente o crédito vai para a top-model internacional Gisele Bündchen, que declarou certa vez ser a marca que mais gostava. Daí em diante as vendas subiram extraordinariamente.
No ano de 2005 o jornalista e crítico musical Silvio Essinger lançou o livro “Batidão – uma história do funk”. Neste mesmo ano, o documentário “Sou feia, mas tô na moda” estreou nas Ilhas Britânicas e ainda foi comprado pela rede de TV árabe Al Jazeera, culminando em contratos para show da MC Tati Quebra-Barraco no Golfo Pérsico.
Em 2007, pela gravadora Som Livre, foi lançado o CD “Clássicos do funk”, compilando 17 funks que fizeram sucesso na década de 1990, quando o ritmo começou a ser reconhecido e foi projetado para além das favelas e morros cariocas. Entre as faixas destacam-se “Rap da felicidade” (Kátia e Julinho Rasta) interpretado pela dupla Cidinho e Doca; “Rap do Salgueiro”, da dupla Claudinho e Buchecha; “Rap do Silva” (Cidinho e Doca) cantado por Mc Bob Rum; “Feira de Acari” (DJ Pirata e DJ Marlboro) com MC Batata; “Nosso sonho” (MC Buchecha) com Claudinho e Buchecha; “Princesa” com MC Marcinho; “Estrada da Posse” com MC Coiote e MC Rapozão (deles próprios) e ainda o rap “À distância”, de autoria da dupla MC Márcio e MC Goró, interpretado por eles mesmos. Neste mesmo ano de 2007, outro disco de importância para o funk também seria lançado pela mesma gravadora. O CD “Neo funk”, trouxe em suas 14 faixas expoentes da nova geração do funk espalhada pelo Brasil. O CD foi produzido por DJ Chernobyl, o mesmo produtor do disco de funk “Pancadão do Caldeirão do Huck”, que chegou à marca de 70 mil discos vendidos. Entre as faixas destacam-se “Uh! É cabaré” com MC Jean Paul; “Mais pressão” com o grupo Comunidade Nin-Jitsu; “Office boy com o grupo Bonde do Rolê; “De baile” interpretado pelos MCs HC; “Ke ketchup” com Tigrinha e MC Maguila; “Umbanda larga” com Miami Bros e ainda a faixa “Motoboy” interpretada por Dr. Ghory e as Ghoretes.
“O Funk” (atualizado de 2010 a 2020)
Em 2010 surgiu no cenário nacional a cantora, compositora e dançarina Anitta (Larissa de Macedo Machado – 30/3/1993 Rio de Janeiro), que logo em seguida tornou-se um fenômeno de vendas.
No ano de 2012 os cineastas Renato Barreiros e Konrad Dantas lançaram o documentário “Funk Ostentação”, no qual mostraram a origem desta tendência do gênero musical paulistano. No ano posterior, em 2013, Anitta se firmaria como um fenômeno de vendas, galgando o status de artista com a 5ª maior arrecadadora de venda de discos daquele ano, por conta de seu primeiro CD “Anitta”, lançado pela gravadora Warner Music.
Em 2014 foi lançado o documentário “No Fluxo”, do diretor paulistano Renato Barreiros, no qual foram registrados alguns dos principais bailes funk (fluxos, como são conhecidos) da periferia e da região metropolitana de São Paulo.
No ano de 2016 foi publicada no jornal O Globo a matéria intitulada “Cavaquinho Pancadão”, assinada por Leonardo Lichotteno qual ele afirmava que o instrumento do samba invadiu o funk e chamou a atenção em músicas como “Essa mina é louca”, com Anitta. Segundo o jornalista foram perfilados alguns artistas do gênero que fizeram uso do cavaquinho em suas produções. De acordo com a matéria, um dos primeiros artistas a fazer uso do instrumento foi MC Leozinho, em 2008, na composição “Sente a pegada”, mais tarde, apareceram outros, tais como MC Gigi, em 2012, como funk “Ao som do meu cavaquinho”. Já MC Delano (cavaquinista), que tocava pagode e fazia, também, produção de trabalhos de funkeiros, lançou em 2015 o funk “Devagarzinho”, trazendo o cavaquinho para o centro das atenções deste funk. Outro funkeiro, MC Menor da VG, também introduziu o cavaquinho em seu funk “Conto do pescador”. Contudo, uma produção destacou-se: “Essa mina é louca” interpretada por Anitta e Jhama (multi-instrumentista: piano, saxofone e violão), funkeiro que já fora ligado ao samba, ex-violonista da banda de Jorge Aragão. No lastro dessa nova moda a funkeira Ludmila gravou “Te ensinei certo”, de autoria de Jhama. Sobre essa questão do uso do cavaquinho no funk, um dos mestres do instrumento no Brasil, o escritor e cavaquinista Henrique Cazes emitiu sua opinião em entrevista a Leonardo Lichotte, da qual destacamos o seguinte trecho:
“O cavaquinho não nasceu grudado a um gênero. Nos tempos em que eu era do Camerata Carioca, gravamos Vivaldi, Bach, Piazzola… Quando tocam esses sucessos do Seu Jorge com aquele cavaquinho fazendo a levada do sambalanço, é bom, mostra que o instrumento está sendo usado. Além do aspecto musical, há o aspecto simbólico. Porque você abre a possibilidade de atrair pessoas mais novas… O agudo dele pode conviver muito bem com o grave do funk, como acontece hoje numa escola de samba. Essas experiências são sempre bem-vindas. De repente, o cavaquinho deixa de ser um instrumento do samba, do choro e vira um instrumento do samba, do choro e do funk.”
Neste mesmo ano, de 2016, Anitta lançaria o seu segundo disco, “Bang”, com o qual ganhou o “Disco de Platina” pela venda de mais de 250 mil cópias digitais e físicas, fixando de vez o seu nome no rol das artistas brasileiras com carreira internacional, levando o gênero funk para países da América do Sul, América do Norte, Europa e Oriente Médio. Por ser a artista brasileira mais conhecida no exterior, pelo menos no universo pop, Anitta, no ano seguinte, em 2017, apresentou-se no talk show de maior audiência nos Estados Unidos “The tonight show”, do apresentador Jimmy Fallon. A artista tornou-se a atração principal do Réveillon de Copacabana, no Rio de Janeiro, apresentando-se para um público estimado em 2,4 milhões de pessoas. Neste mesmo ano, de 2017, a cantora atingiu pela primeira vez a décima posição na lista dos 50 artistas mais influentes do mundo, realizada pela revista norte-americana de música e entretenimento Billboard, após o lançamento de “Vai malandra”, passando a frente de artistas internacionais como Lady Gaga, Beyoncé e Justin Bieber. No ano posterior, em 2018, foi tema da série documental “Vai Anitta”, da Netflix, registrando os bastidores de sua turnê pelo Brasil e de seus shows pelo mundo. Ainda em 2016 surgiria no cenário artístico outro fenômeno de vendas, IZA (Isabela Cristina Correia de Lima Lima – 3/9/1990 – Rio de Janeiro). A cantora e compositora carioca foi contratada pela gravadora Warner Music e neste mesmo ano lançou o single autoral “Quem sabe sou eu”, que entrou para a trilha sonora da novela “Rock Story”, da TV Globo. Ainda em 2017 foi contemplada com o prêmio de “Revelação do Ano”, pelo “Women’s Music Event Awards”, ano em que lançou o single “Pesadão”, com a participação de Marcelo Falcão. Participou do show do cantor norte-americano CeeLo Green, no festival “Rock in Rio” e abriu o show do grupo inglês Coldplay, no Allianz Parque, em São Paulo.
Em 2018 Iza lançou, pelo selo Warner Music, seu primeiro CD “Dona de mim”, com as participações de Rincon Sapiência, Marcelo Falcão, Ivete Sangalo, Carlinhos Brown e Gloria Groove, Thiaguinho e regravou em dueto com Moraes Moreira a música “Eu sou o carnaval” (Moraes Moreira e Antônio Risério), para o clipe promocional da empresa multinacional Apple, que foi lançado no carnaval. Tornou-se a apresentadora do programa “Música Boa Ao Vivo”, do canal Multishow, posto assumido anteriormente pela cantora Anitta e também pelo cantor Thiaguinho. Apresentou-se, como atração principal, ao lado de Liniker e Lazzo Matumbi, no encerramento da 29ª edição do “Prêmio da Música Brasileira”, interpretando “Negro gato”, em tributo a Luiz Melodia, o grande homenageado da noite. No ano seguinte a cantora passou a integrar o corpo de jurados do reality show “The Voice Brasil”, exibido pela TV Globo, ao lado de Ivete Sangalo, Lulu Santos e Michel Teló. Apresentou-se ao lado de Alcione no Palco Sunset do festival “Rock in Rio”. Lançou o clipe “Evapora”, gravado em parceria com a cantora norte-americana Ciara e com o trio Major Lazer, no Vasquez Rocks Natural Park em Los Angeles (Estados Unidos), projetando sua carreira para o mercado internacional.
O ano de 2019 tornou-se uma data emblemática para o gênero, que ao completar 30 anos foi ovacionado por parte da crítica nacional, tanto que, ganhou o palco do “Rock In Rio” tendo Anitta como atração principal em uma das noites mais concorridas por artistas internacionais. A artista, com carreira internacional, dividiu gravações com Madonna, tendo um dos clipes mais vistos no mundo, levou o funk a um dos gêneros que compõem o pop no cenário mainstream internacional. Contudo o ano não terminaria bem para o gênero, devido a ações truculentas das polícias paulistana e carioca. Em dezembro de 2019 na comunidade de Paraisópolis, a segunda maior favela de São Paulo, durante um baile funk e após a intervenção e ações policiais, nove jovens perderam a vida. No Rio de Janeiro, também em decorrência de ação policial e perseguição ao gênero outros jovens frequentadores do baile funk do Morro do Dendê, no bairro da Ilha do Governador, sofreram ações violentas por conta dos policiais. Sobre estes fatos comentou a pesquisadora e professora de dança da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Coordenadora da Casa das Mulheres Maré, uma das maiores comunidades do Rio de Janeiro, Andreza Jorge:
“Existe uma ideia de ‘vamos levar cultura para a favela’, quando se deveria fortalecer as produções da favela.”
O escritor Micael M. Herschamann, que estudou a repressão policial aos bailes funk do Rio de Janeiro na década de 1990, autor de vários livros sobre o tema, ressaltou:
“O funk é rebeldia de garotos que tiram sarro do Estado e da polícia, mas há um discurso que vem associando isto ao crime organizado. O que há por trás é preconceito social, preconceito de classe. Existe muito mais tolerância com as transgressões da classe média. Vejo um sistema de dois pesos e duas medidas.”
O escritor Marcus Faustini, criador da Agência de Redes Para Juventude, corroborou:
“Não adianta o funk ser reconhecido como patrimônio cultural, ser pesquisado por intelectuais, se a base dele segue sendo atacada. Não preciso nem repetir que os bailes geram empregos e opções de lazer a uma camada da sociedade que não tem isso. É uma cultura poderosa, que viajou o mundo, superou a ideia de que era só sobre sexualização, respingou na moda, nos gêneros musicais, deu público para muito artista. O funk se conecta com Adriana Calcanhotto, com Caetano Veloso. Ele entregou coisas que foram usadas em novelas, documentários, na moda.”
Enquanto isto, a artista do gênero e com mais visibilidade no exterior, a cantora Anitta, neste mesmo ano de 2019, lançou o CD trilíngue “Kisses”, com 10 faixas inéditas e participações de artistas nacionais e internacionais como Caetano Veloso, Snoop Dog, Ludmilla, Papatinho, Prince Royce, DJ Luian, Mambo Kingz, DJ Alesso, Swae Lee e Becky G. Ainda em 2019 gravou, em dueto com a cantora Madonna, a música “Faz gostoso”, uma das faixas do CD da pop star norte-americana, intitulado “Madame X”, produzido por Mirwais Ahmadzai. Foi a atração que abriu a penúltima noite de shows no Palco Mundo do festival “Rock in Rio”, no Rio de Janeiro. Esteve entre os artistas que se apresentaram na cerimônia de entrega do “Grammy Latino”, em Los Angeles (Estados Unidos), interpretando a música “La vida es um carnaval”, ao lado de Milly Quesada, Olga Tañón e Tony Succar. Gravou a música “Pantera”, para a trilha sonora do filme norte-americano “As panteras”, que estreou nos cinemas neste mesmo ano de 2019.
No ano 2020 o Instituto Moreira Salles, do Rio de Janeiro, em parceria com a Agência de Redes Para Juventude, promoveu o evento “Escuta Festival”, com a participação de ativistas e artistas do gênero, além de uma edição da festa “Eu Amo Baile Funk”. Neste mesmo ano, de 2020, no Canal HBO estreou a série documental intitulada “Funk.Doc”, do diretor Luiz Bolognesi, nos quais relatou os “fluxos” de favelas como Heliópolis e Paraisópolis, ambas da cidade de São Paulo. Sobre os fluxos (bailes, como são conhecidos no Rio de Janeiro) o diretor esclareceu:
“Os fluxos são feitos por carros tunados, com caixas de som que estacionam em comunidades e bairros. Eles abrem o porta-malas e tocam uma seleção de músicas por pen-drive. Quando um fluxo pega, se populariza, chega a ter 40 carros, reunindo até oito mil, dez mil pessoas.”
BIBLIOGRAFIA CRÍTICA:
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HERSCHAMANN, Micael M. Música, juventude e violência urbana: o fenômeno funk e rap. In Revista Comunicação&Política. N.s., nº 2. Rio de Janeiro: Editora Cebela, 1995, pp.89 – 96.
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RONDELLI, Elizabeth. “Media, representações sociais da violência, da criminalidade e ações políticas”. In Revista Comunicação & Política. N.s., nº 2. Rio de Janeiro: Ed. Cebela, 1995, pp. 97 – 108.
SOARES, Luiz Eduardo. “A Segurança Pública como Questão das Esquerdas”. In Fórum Social Mundial, 2001.
GLOSSÁRIO:
Bundalelê: “Qualquer coisa”, no sentido de “Coisa sem valor”.
Cachorra: O mesmo que tchutchucas e popozudas – Mulher liberada.
Cachorro: PM.
Fluxo: Baile como é conhecido em São Paulo. No Rio de Janeiro e em vários estados é conhecido como “Baile”.
Função diferenciadora: Qualidade que ajuda a diferenciar alguma coisa de outra.
Funk: Vocábulo que no inglês coloquial significa “odor forte”, associado ao suor dos dançarinos de soul, mais conhecido no Brasil como “fudum” ou “subaquera”.
Hedonismo: Doutrina filosófica que procura no prazer a finalidade da vida.
HK: Fuzil.
Mainstream: “Corrente principal” ou “fluxo principal”.
Panteão: Conjunto de figuras públicas que perduram na memória individual ou coletiva.
Patrão: Chefe do tráfico.
Quebrar Barraco: Manter relações sexuais.
Xis: Cela.
X 9: Delator.