Cantora.
Juntamente com Marília Baptista é apontada como a melhor intérprete da obra de Noel Rosa. Nasceu e cresceu no Encantado, bairro do subúrbio do Rio de Janeiro. Seu pai, Baltasar Teles de Almeida, era chefe de trens da Central do Brasil. Ainda jovem, cantava no coro da igreja Batista da qual seu irmão Alcides era pastor. Menina pobre, desde os tempos de criança sonhava em ser cantora de rádio, o que acabou acontecendo a partir de seu encontro com o compositor Custódio Mesquita, para quem cantou “Bom dia, meu amor”, de Joubert de Carvalho e Olegário Mariano. Durante essa década vai morar em São Paulo, onde reside por 12 anos (1950-1962). Foi casada com o goleiro de futebol Rei (José Fontana), que jogou no Vasco e no Bangu, entre as décadas de 1930 e 1940, mas o casamento durou pouco tempo. Cantava samba, mas era apreciadora de música clássica e se interessava por leituras de psicanálise, além de ter em sua casa quadros de importantes pintores brasileiros como Aldemir Martins e Di Cavalcanti. Os que conviviam com ela, na intimidade ou profissionalmente, a viam como uma mulher lida e esclarecida. Tratada por amigos pelo apelido de “Araca”, dela Noel Rosa disse, em 1933, numa entrevista a Orestes Barbosa, para “A Hora”: “Aracy de Almeida é, na minha opinião, a pessoa que interpreta com exatidão o que eu produzo”.
Grande intérprete da obra de Noel Rosa, começou a cantar profissionalmente na Rádio Educadora, em 1933, por intermédio de Custódio Mesquita, tornando-se um dos nomes mais conhecidos da fase de ouro do rádio. Por essa época, já conhecia Noel Rosa e, segundo o pesquisador Antônio Epaminondas, saía muito com o compositor, “ele de violão em punho, frequentando tudo o que era casa suspeita, botequins, nas imediações da Central do Brasil, na Taberna da Glória, etc. e ela ainda de menor”.
Em 1934, gravou seu primeiro disco, para a Columbia, interpretando a marcha de carnaval “Em plena folia”, de Julieta de Oliveira. Em seguida gravou a marcha “Golpe errado”, de Jaci. No final do mesmo ano, gravou a primeira música de Noel Rosa, o samba “Riso de criança”, ainda pela Columbia. Em 1935, assinou contrato com a Rádio Cruzeiro do Sul e passou a integrar o elenco da gravadora Victor, participando de diversas gravações fazendo parte do coro. No mesmo ano realizou sua primeira gravação solo na Victor, interpretando os sambas “Triste cuíca”, de Noel Rosa e Hervê Cordovil e “Tenho uma rival”, de Valfrido Silva. No mesmo ano gravou o samba “Pedindo a São João”, Herivelto Martins e Darci de Oliveira e a marcha “Santo Antônio, São Pedro, São João”, de Herivelto Martins e Alcebíades Barcelos, músicas destinadas ao chamado repertório de meio de ano.
Em 1936 gravou seu primeiro grande sucesso composto por Noel Rosa, o samba “Palpite infeliz”, muito cantado no carnaval daquele ano, embora não originalmente destinado aos festejos de Momo. No mesmo ano, gravou os frevos canção “manda embora essa tristeza”, de Capiba e “Já faz um ano”, de Nelson Ferreira. No mesmo período, ingressou na Rádio Tupi. Ainda em 1936, foi filmado “Alô, alô, carnaval”, dirigido por Adhemar Gonzaga e produzido pelo americano Wallace Downey. Neste filme, Noel Rosa sugeriu aos roteiristas e também compositores, João de Barro (Braguinha) e Alberto Ribeiro, que os versos “Quem é você que não sabe o que diz/ Meu Deus do céu, que palpite infeliz” fossem interpretados pela cantora lavando roupa num quintal modesto. Ao chegar ao estúdio da Cinédia, a cantora mostrou-se irritada com a sugestão de Noel Rosa e recusou-se a interpretar a cena, retirando-se das filmagens. Noel Rosa, contrariado, chegou a declarar ao “Correio da Noite” que deixaria de compor canções para serem gravadas por ela, mas tal fato não aconteceu e os dois continuaram amigos até a morte de Noel.
Em 1937 gravou com o cantor Castro Barbosa os sambas “Eu e você e “Helena”, ambos da dupla Raul Marques e Ernâni Silva. No mesmo ano lançou de Noel Rosa os sambas “Eu sei sofrer” e “O maior castigo que eu te dou”. Também no mesmo ano, fez bastante sucesso com o samba “Tenha pena de mim”, de Ciro de Souza e Babaú, o que levou o cantor Sílvio Caldas a reclamar com os autores por não terem lhe dado o samba para gravar. No mesmo período, tranferiu-se para a Rádio Nacional. Em 1938 gravou com Lamartine Babo as marchas “Vaca amarela”, de Lamartine e Carlos Neto e “Esquina da sorte”, de Lamartine e Hervê Cordovil. No mesmo ano lançou o samba canção “Último desejo”, derradeira composição de Noel Rosa, gravada no ano anterior pouco depois da morte do compositor. No mesmo ano gravou os sambas “Século do progresso” e “Rapaz folgado”, ambos também de Noel.
Em 1939 lançou com grande êxito o samba “Camisa amarela”, de Ary Barroso, que tornou-se um clássico da música popular brasileira. No mesmo ano, gravou o samba “Fale mal…mas fale de mim”, de Ataulfo Alves e Marino Pinto. Em 1940 lançou os sambas “Oh! Dona Inês” e “Brigamos outra vez”, ambos de Wilson Batista e Marino Pinto e “Saudosa favela”, de Heitor dos Prazeres. Além das rádios Educadora (que se tornaria mais tarde Rádio Tamoio) e Cruzeiro do Sul, atuou nas rádios Mayrink Veiga, Ipanema, Cajuti e Philips, onde, no Programa Casé, fez dupla com o cantor e compositor Sílvio Caldas.
Em 1942 fez sucesso com o samba “Fez bobagem”, de Assis Valente e com a marcha “Tem galinha no bonde”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira. No mesmo ano, passou a gravar na Odeon, onde estreou com as marchas “Mamãe lá vem o bonde”, de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira e “Que passo é esse Adolfo”, de Haroldo Lobo e RobertoRoberti, que fazia alusão ao dirigente alemão Adolf Hitler.
Em 1943 gravou, entre outros, os sambas “Quero um samba”, de Wilson Batista e Valdemar Gomes e “Gosto mais do Salgueiro”, de Wilson Batista e Germano Augusto. No ano seguinte voltou a gravar uma composição de Assis Valente, o samba “Jacaré te abraça”. Em 1945, entre outras gravações, registrou o samba choro “Flauta, cavaquinho e violão”, de Custódio Mesquita e Orestes Barbosa, o samba “Tudo acabado”, de Heitor dos Prazeres e a marcha “Tem cabrito na horta”, de Benedito Lacerda e Haroldo Lobo. Em 1946 lançou com grande sucesso o samba canção “Saia do caminho”, de Custódio Mesquita e Evaldo Rui, que se tornou um clássico e cuja gravação estava destinada a ser feita pelo cantor Jorge Goulart, não ocorrendo entretanto devido à morte prematura de Custódio Mesquita aos 35 anos, na véspera da gravação. No mesmo ano participou do filme “Segura esta mulher”, com direção e roteiro de Watson Macedo.
Em 1947 lançou com sucesso o samba “Louco, ela é o seu mundo”, de Henrique de Almeida e Wilson Batista. Gravou ainda, o samba “Deixa o mundo falar”, de Ary Barroso, com o Trio Madrigal e os Vocalistas Tropicais, a rumba “Escandalosa”, de Moacir Silva e Djalma Esteves e com os Vocalistas Tropicais o samba canção “Quem foi?”, sucesso daquele ano, composto por Nestor de Holanda e Jorge Tavares. No ano seguinte lançou com grande sucesso o samba “Não me diga adeus”, de Luiz Soberano, J. G. da Silva e Paquito, vencedor do carnaval daquele ano. Participou ainda do filme “Esta é fina”, juntamente com Linda Batista, Nelson Gonçalves, Nuno Roland, Marlene e outros. No mesmo ano, passou a apresentar-se na Boate Vogue, onde permaneceria durante quatro anos com um repertório onde se destacavam diversos sambas de Noel Rosa. Em 1949 gravou mais uma composição do Poeta da Vila, o samba “João Ninguém”.
Nos anos 1950, foi a responsável pelo ressurgimento do nome de Noel Rosa (1910-1937) para o grande público, gravando e regravando muitos de seus sucessos. Em 1950 gravou pela Continental uma série de três discos com músicas de Noel Rosa, entre as quais, os clássicos “Palpite infeliz”, “Conversa de botequim” e “Feitiço da Vila”, as duas últimas, parcerias com Vadico. O primeiro desses discos, recebeu arranjos de Radamés Gnatalli, capa de Di Cavalcanti e textos de Lúcio Rangel e Fernando Lobo. No ano seguinte gravou de Fernando Lobo e Paulo Soledade o bolero “basta dizer que sim”. No mesmo ano registrou com o Trio Madrigal e com o Trio Melodia os sambas “A dor do amor”, de Antônio de Almeida e João de Barro e “Tem pena de mim”, de Hervê Cordovil. Também no mesmo período, gravou dois baiões, fato inédito em sua carreira de sambista, em gravação conjunta com o Trio Melodia, “Rua do sol”, de Hervê Cordovil e Manezinho Araújo e “Baião sacudido”, de Humberto Teixeira e Luiz Bandeira. Em seguida, lançou mais três discos em 78 rpm com sambas de Noel Rosa, trazendo os clássicos “Pra que mentir”, “Silêncio de um minuto”, “Feitio de oração”, “Com que roupa”, “O orvalho vem caindo” e “Três apitos”, esta, em sua primeira gravação, todas em interpretações marcantes. Estas gravações deram início a uma redescoberta da obra de Noel Rosa, que ficara esquecido durante a década anterior.
Em 1953 lançou dois ritmos pouco usuiais em seu repertório de sambista, o cortajaca “Pezinho pra cá, pezinho pra lá”, de João de Barro e o baião “Chegou o goloso”, de Norival Reis e Rutinaldo. No mesmo ano gravou de Vinícius de Morais e Antônio Maria o samba “Quando tu passas por mim”. No mesmo ano conheceu um de seus últimos grandes sucessos, o samba canção “Se eu morresse amanhã”, de Antônio Maria. Em 1955 lançou pela Continental o LP “Canções de Noel Rosa com Aracy de Almeida”, com acompanhamento de orquestra regida por Vadico, parceiro de Noel, no qual interpretou, entre outras músicas, “Meu barracão”, “Voltaste”, “Fita amarela” e “A melhor do planeta”. No mesmo ano participou do filme “Carnaval em lá maior”, dirigio por Adhemar Gonzaga.
Em 1957 fez uma representativa gravação do samba “Bom dia tristeza”, parceria de Adoniran Barbosa e Vinícius de Morais. No ano seguinte, registrou pela Polydor os sambas “Eu vou pra Vila”, de Noel Rosa e “Tristezas não pagam dívidas”, de Ismael Silva. Em 1960 a Philips lançou o LP “Samba”, no qual a cantora interpretou entre outros, “A verdade dói”, de Vadico, “Chorando pedia”, de Vinícius de Moraes, “Suspiro”, de Noel Rosa e Orestes Barbosa e “Onde está a honestidade?”, de Noel Rosa. Em 1962, foi lançado pela RCA o elepê “Chave de Ouro”, com reaproveitamento de antigas gravações realizadas pela cantora.
Em 1964, ao lado da dupla Tonico e Tinoco, gravou o cateretê “Tô chegando agora” e apresentou-se com Sérgio Porto e Billy Blanco na boate Zum-Zum, no Rio de Janeiro. No ano seguinte, participou com o sambista Ismael Silva do show “O samba pede passagem”, no Teatro Opinião. No mesmo ano, participou do show “Conversa de Botequim”, de Miéle e Bôscoli, e se apresentou ao lado do cantor Murilo de Almeida na boate Le Club. Ainda no mesmo período participou juntamente com outros cantores do show de despedida do cantor Sílvio Caldas no Maracanãzinho, despedida que acabou não se concretizando.
Em 1966 foram lançados três elepês com gravações suas, com destaque para “Samba pede passagem”, gravado com Ismael Silva, no qual os consagrados artistas interpretam seus sucessos, além de “Sonho de carnaval”, de um então iniciante Chico Buarque. Em 1968, participou do programa de calouros “Proibido colar cartazes”, ao lado do cômico Pagano Sobrinho, apresentado pela TV Record, de São Paulo. Ao ser insistentemente convidada para gravar depoimento sobre sua vida e sua carreira no Museu da Imagem e do Som (MIS), respondeu ao então diretor, Ricardo Cravo Albin: “Lá não piso! Sei que se gravar meu depoimento, morrerei no dia seguinte”. E, de fato, a cantora jamais gravou o tão esperado depoimento.
Em 1969, apresentou-se na boate paulista Canto Terzo e participou do show “Que Maravilha!”, ao lado de Jorge Ben (depois Jorge Benjor), Toquinho (que naquele ano iniciaria sua parceria com Vinícius de Moraes) e Paulinho da Viola no Teatro Cacilda Becker, em São Paulo. Nas décadas de 1970 e 1980 ficou conhecida por grande parte do público como jurada de programas de auditório, aparecendo como uma senhora rabugenta, sempre de óculos escuros e mau-humor. Na verdade, tratava-se de uma personagem criada pela cantora para atrair a atenção do telespectador de programas como “A buzina do Chacrinha” e “Sílvio Santos”.
Em 1980 relizou show no Teatro Lira Paulistana, que acabou chegando ao disco, num lançamento póstumo da Continental, em 1988, intitulado ” Äracy de Almeida ao Vivo”. Após sua morte, a remasterização de antigas gravações e o relançamento em CD de antigos sucessos redimensionam a sua importância como intéprete.
Em 1998, a cantora Olívia Byington lançou o CD “A Dama do Encantado” onde prestou homenagem à cantora, reunindo 20 sucessos de seu repertório, com composições de Noel Rosa, Assis Valente, Ary Barroso, Vinícius de Moraes e Custódio Mesquita, entre outros, e contando com participações especiais como as de Chico Buarque e direção musical de Maurício Carrilho. Em agosto de 2001, foi uma das grandes cantoras da era do rádio homenageadas no show escrito e dirigido por Ricardo Cravo Albin, “Estão voltando as flores”, estrelado pelo grupo Cantoras do Rádio. O espetáculo permaneceu quatro meses em cartaz no Teatro de Arena, em Copacabana. Em setembro do mesmo ano, estreou no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, o musical “Aracy de Almeida no país de Araca”, com texto e direção de Eduardo Wotzick, baseado na vida da cantora. Ainda em 2001, foi inaugurado o “Centro Popular de Cultura Aracy de Almeida”. Em 2004, em homenagem aos 90 anos de nascimento da cantora foi lançado o livro “Araca – Perfil da Arquiduquesa do Encantado”, de H. Bello de Carvalho. Nesse ano, foi homenageada em show no auditório da Rádio Nacional, em comemoração a seus 90 anos de nascimento, com as presenças de Xangô da Mangueira, Agenor de Oliveira, Quarteto Araca e Gil Miranda. Em 2005, estreou no “Espírito das Artes” na Cobal de Botafogo, RJ, o espetáculo “Aracy de bolso – Um tributo à dama do Encantado” com a cantora Gil Miranda, backing vocal da banda Cidade Negra e o cantor Marcelo Maciel do grupo Manga de Colete. Seu talento para cantar sambas e músicas carnavalescas fez com que fosse chamada pelo locutor César Ladeira de “O samba em pessoa”. Em 2012, sua interpretação para o samba “Mangueira”, de Assis Valente, foi incluída no CD duplo “Assis Valente não fez bobagem – 100 anos de alegria” lançado pela EMI em homenagem ao centenário de nascimento do compositor. Em 2014, em razão do centenário de seu nascimento foi homenageada pela Cia. Teatral Luzes da Ribalta e Grupo Arquéthipo com o espetáculo “Aracy de Almeida – A Dama do Encantado”, com texto e direção de Gedivan de Albuquerque, arranjos, preparação vocal e direção musical de Jonas Hammar, com Thiago Macedo, Gedivan de Albuquerque e Daniela Calcia, e com a atriz Kikha Dantas no papel da cantora. O espetáculo estreou no Centro Cultural Parque das Ruínas, em Santa Tereza. No mesmo ano, o cronista Artur Xexéo, do jornal O Globo, escreveu em sua homenagem a crônica “O samba em pessoa” onde disse sobre ela: “Resumindo: foi graças ao “Bossaudade” que minha geração conheceu, na força de seus 51 anos de vida, Aracy de Almeida. (…)Aracy, além de muita personalidade para cantar, tinha também um jeito muito próprio de participar de entrevistas. Isso a tornou a mais popular dos “velhinhos” que faziam parte do “Bossaudade”. Ela começou a participar de outros programas de TV. Em muitos deles, ela nem cantava. Só aparecia para contar casos com seu vocabulário muito específico e seu mau humor muito bem-humorado. (…)Aracy era uma cantora sofisticada, de respiração única e timbre muito particular. Era daquelas que a gente reconhecia a voz logo nos primeiros acordes de qualquer samba”. Em 2018, foi homenageada pelo cantor Marcos Sacramento com o CD “A Rainha dos parangolés”, no qual o cantor, acompanhado pelo violonista Flávio Alcofra, relembou gravações da cantora como “Último desejo”, “O orvalho vem caindo” e “O século do progresso”, de Noel Rosa, “Camisa amarela”, de Ary Barroso, e “Triste cuíca”, de Noel Rosa e Hervê Cordovil, entre outras.
(Série Os Ídolos do Rádio Vol. XIII)
Aracy de Almeida e Ismael Silva
ALBIN, Ricardo Cravo. Dicionário Houaiss Ilustrado Música Popular Brasileira – Criação e Supervisão Geral Ricardo Cravo Albin. Rio de Janeiro: Instituto Antônio Houaiss, Instituto Cultural Cravo Albin e Editora Paracatu, 2006.
ALBIN, Ricardo Cravo. MPB: A História de um século. Editora: Funarte. Rio de Janeiro, 1997.
AMARAL, Euclides. Alguns Aspectos da MPB. Rio de Janeiro: Edição do Autor, 2008. 2ª ed. Esteio Editora, 2010. 3ª ed. EAS Editora, 2014.
AZEVEDO, M. A . de (NIREZ) et al. Discografia brasileira em 78 rpm. Rio de Janeiro: Funarte, 1982.
CABRAL, Sérgio. No tempo de Ary Barroso. Editora: Lumiar. Rio de Janeiro, 1993.
CARDOSO, Sylvio Tullio. Dicionário Biográfico da Música Popular. Edição do autor. Rio de Janeiro, 1965.
COSTA, Cecília. Ricardo Cravo Albin: Uma vida em imagem e som. Rio de Janeiro: Edições de Janeiro, 2018.
EFEGÊ, Jota. Figuras e coisas da Música Popular Brasileira. Editora: MEC/FUNARTE. Rio de Janeiro, 1978.
EPAMINONDAS, Antônio. Brasil brasileirinho.Editora: Instituto Nacional do Livro. Rio de Janeiro, 1982.
MARCONDES, Marcos Antônio. (ED). Enciclopédia da Música popular brasileira: erudita, folclórica e popular. 2. ed. São Paulo: Art Editora/Publifolha, 1999.
MARIZ, Vasco. A canção brasileira. Editora: Francisco Alves. Rio de Janeiro, 2000.
SEVERIANO, Jairo e MELLO, Zuza Homem de. A canção no tempo. Volume 1. Editora 34. São Paulo, 1997.
VASCONCELOS, Ary. Panorama da Música Popular Brasileira. Vol. 2. Editora: Martins. Rio de Janeiro, 1965.
A cantora Aracy de Almeida não foi apenas a intérprete do melhor da MPB. Ela sempre foi muito mais, considerada que era “o Samba em pessoa”. Aracy, no começo do século XXI, começa a ser objeto de várias homenagens, entre elas o lançamento de toda sua discografia e uma peça de teatro.
A coleção de 8 CDs duplos, fruto das pesquisas do colecionador Paulo Cezar de Andrade, é um tesouro fonográfico que abriga gravações de Aracy, que vão desde seus momentos iniciais (“Riso de criança”, de Noel Rosa e “Saudade de meu papai”, de Walfrido Silva e Roberto Martins), registradas em 1934, quando a cantora estreou acompanhada por Mestre Pixinguinha até os LPs maravilhosos da Elenco (Aluísio de Oliveira) dos anos 60, em que ela atua ao lado de Sérgio Porto e Billy Blanco. Ou seja, além de cada CD contabilizar o robusto número de 23 músicas em média, estão também transcritos todos os 8 LPs que Aracy gravou, inclusive o último, pouco antes de morrer em 1988, o raríssimo “Ao vivo e à vontade”, para a Continental.
É de pasmar a qualidade das músicas que Aracy escolheu para gravar. Para que se tenha uma idéia, ela reviveu algumas das mais preciosas jóias de Noel (compositor favorito e seu maior protetor no meio artístico), como “Palpite Infeliz” (1935), “X do Problema” (1936), “Eu sei sofrer” (37) e “Século do Progresso” (37). E, depois da morte do Poeta da Vila, o “Samba em pessoa” continuou honrando o padrinho lançando pérolas como “Camisa amarela” (Ary Barroso, 39), “Cuco” (Haroldo Lobo, carnaval de 40), “Fez bobagem” (Assis Valente, 42) e ainda “Saia do meu caminho” (Custódio Mesquita, 45), ou mesmo “Louco” (Wilson Batista, 46).
Aracy – com seu jeito descontraído e originalíssimo de ser e proceder – sempre viveu cercada de intelectuais nos anos dourados do Rio, a década de 50-60. Lembro-me de que certa vez o pintor Di Cavalcanti, em casa de quem no Catete eu estava, interrompeu uma reunião declarando solenemente: “Agora eu tenho que sair, porque marquei encontro no Lamas com a maior cantora brasileira de todos os tempos e, que vocês sabem muito bem que é a divina Araca”.
Aracy, aliás, sempre manteve fidelidade a seus amigos. Na década de 50, ela regravou quase todo o melhor de Noel, quando já ninguém mais se lembrava da música do poeta da Vila.
Esquecida nos anos 60 e 70, Aracy me telefonou certa noite para dizer que havia recebido convite para ser jurada de programas de tevê. “ – Araca, vai com calma. Você sabe que a máquina de fazer doido pode queimar o seu filme”. Ela me respondeu, como de hábito, com uma série dos mais afiados palavrões e resolveu ir em frente.
Quando Aracy morreu, em 1988, alguns obituários de jornais referiram-se ao fato de ela ser apenas uma das juradas do Sílvio Santos, omitindo-lhe a condição de deusa do canto popular que ela sempre fora.
Ricardo Cravo Albin